Obstáculos e dificuldades no trabalho: efeitos sobre a saúde do professor
por Anselmo Lima
Apesar de os obstáculos e dificuldades de trabalho encontrados nas escolas serem inúmeros e frequentemente imprevisíveis, muitos deles – se não a grande maioria – passam “despercebidos”, isto é, não é possível que o professor tome consciência deles ou a eles reaja em função, dentre outras coisas, de diferentes graus de desengajamento causado ao longo do tempo pela precariedade das condições de exercício da profissão.
Esses obstáculos e dificuldades não são, entretanto, totalmente indesejáveis, pois têm o potencial de desencadear no professor processos de tomada de consciência e, dessa forma, de se constituírem como o motor da recriação dos gestos profissionais docentes no momento de sua repetição. O problema é que a ausência de percepção dos obstáculos e dificuldades ou mesmo a própria percepção da impossibilidade de superá-los faz com que o docente nem sequer tente reagir a eles e leva a que os gestos do professor se repitam praticamente ao idêntico, sem adaptação às condições reais de sua execução.
Tais fatos – como será ressaltado no próximo post – representam justamente o princípio do adoecimento docente no trabalho, além de indicarem de forma inequívoca que a possibilidade efetiva de repetição com recriação de gestos profissionais é, por excelência, promotora da formação e da saúde do professor no trabalho, enquanto sua impossibilidade leva inevitavelmente à estagnação profissional e ao adoecimento.
Professor, quais são os obstáculos e dificuldades que você enfrenta em sua sala de aula? Você consegue superá-los a cada vez que se manifestam ou se trata de obstáculos e dificuldades que considera insuperáveis e, por isso mesmo, já nem se esforça mais? Como costuma reagir quando esbarra nesses obstáculos e dificuldades que parecem insuperáveis? São questões que dizem respeito a sua consciência profissional e, consequentemente, a sua saúde no trabalho e também fora dele.
Olá, professor Anselmo. Boa tarde! As escolas aqui no meu município não oferecem condições dignas de trabalho para os profissionais. Como mencionei em comentários anteriores, na escola em que trabalho as salas não são forradas, os ventiladores estão quebrados, os alunos não têm água gelada para beber, etc. A escola fica localizada numa área em que, no verão, as máquinas da prefeitura raspam para limpar, o que se torna um grande problema: a ventania acaba enchendo as salas de terra e a gente não consegue nem respirar. Quanto aos problemas de saúde, são muito sérios. Eu, por exemplo, quando termina o expediente, minha garganta chega a arder de tanto falar alto para uma turma com 34 alunos, sem forro na sala. Tenho crises de fogacho por conta da menopausa. Às vezes penso que vou desmaiar, pois os ventiladores quase sempre estão quebrados. E, para piorar, tenho síndrome do túnel do carpo. Minhas mãos têm dias que não consigo fechar. Mas não tem como parar, pois se for para o INSS o salário fica uma miséria, e para quem tem dois filhos na faculdade não dá. A gente acaba se submetendo a essas situações.
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Prezada Ivone, muito obrigado por compartilhar sua situação! Seu depoimento é uma contribuição importante para as discussões deste Blog. Fica claro a partir de sua experiência que não se trata apenas de cuidar das condições de trabalho do professor para que ele não adoeça. É preciso também fazer isso para que não se agrave algum possível problema de saúde que o professor por ventura já tenha. Gostaria de lhe perguntar o seguinte: sua escola oferece aos professores alguma oportunidade de formação docente continuada? Caso afirmativo, o que é oferecido? A precariedade no trabalho é abordada nessas ocasiões ou só se fala naquilo que os professores “deveriam” fazer, mesmo que não tenham condições adequadas? Convido você a ler aqui no Blog o post sobre a “Clínica da Atividade Docente” e a registrar sua opinião nos comentários. Um abraço!
https://formacaoesaudedoprofessor.com/2016/03/28/clinica-da-atividade-docente-uma-proposta-de-formacao-continuada-e-de-promocao-da-saude-do-professor-no-trabalho/
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Os obstáculos em um certo nível podem ser um motivo para a ação do professor, uma dificuldade enfrentada faz como haja movimento. Mas eu fico pensando o que acontece com o professor que só encontra obstáculos em sua carreira? a resposta é clara, o adoecimento. Trabalhei em uma escola do município e toda vez que queria fazer algo diferente com meus alunos tinha que consultar a equipe pedagógica, mas nunca podia fazer nada, pois sempre recebia um NÃO, isso me desmotivou um pouco, mas o problema não era apenas esse, bem como a Ivone comentou, há também os problemas do espaço escolar, a estrutura em que os alunos e professores estão inseridos. Nessa mesma escola que trabalhei era feita de madeira, e os alunos sentiam muito calor no verão, dessa forma, fazia com que eles ficassem com muita preguiça de realizar as atividades, além disso, não podia ir em outros ambientes da escola, pois a coordenação pedagógica não permitia. São situações assim que vão desmotivando e o professor só vê problemas.
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Concordo, Camila! Há inúmeros fatores que podem desmotivar o professor. Por isso creio que as relações de intercâmbio (professor-professor; professor-aluno; professor – família; escola- comunidade) dentro do ambiente escolar são essenciais.
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Manter nossa mente livre da ofensa que pode advir dos problemas que surgem é um bom começo para pensarmos em manter sempre a disposição de enfrentar a dificuldade.
Se ficarmos ofendidos achando que os problemas surgem para nos expor, ou se, de alguma forma, pensarmos que problema é indício de um trabalho ruim, teremos grande dificuldade em manter a disposição para encontrar uma saída.
Tudo o que discutimos anteriormente prepara o caminho para essa etapa.
Se mantivermos vivo o processo de recriação, se temos inspiração para manter nosso estilo, se conseguimos, na medida do possível, manter um bom relacionamento nas diferentes esferas que envolvem a atividade docente (sala de aula, escola, lares) e se estamos atentos para nos auto-observar teremos o conjunto de ferramentas necessário para buscar as soluções.
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A confiança nos outros professores que fazem parte do coletivo é, como a Rebecca bem pontuou, essencial. Se em tudo enxergamos ofensas, como poderemos trabalhar juntos? Ao meu ver, sem ela é impossível.
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Como bem colocado no post, os obstáculos e dificuldades não são totalmente indesejáveis, eles ajudam o professor a tomar consciência e repensar sua recriação no momento da repetição. Só que isso só é possível quando há a reflexão da parte do professor, quando se tem um eu observador e um eu observado.
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O fato do professor ter a consciência de que a reflexão sobre suas práticas é um exercício importante e constante em suas atividades, certamente ajudará quando se encontrar frente a um obstáculo muito grande.
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Bem colocado Barbara só é possível ver esses obstáculos se o professor refletir, porem muitas vezes isso não ocorre
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Exatamente, isso acaba se tornando algo que faz o professor crescer não só profissionalmente, mas também no âmbito pessoal. São características de uma profissão que é guerreira e que, mesmo com os constantes desafios diários, nada consegue dissuadir o docente de sua persistência para resultados melhores.
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Professor, acredito que a tendencia das pessoa é ver o obstáculo como algo negativo, porem muitas vezes o obstáculo é constitutivo da atividade docente é aquilo que nos coloca em atividade, porque toda atividade é uma superação de obstáculos. O problema não é encontrar o obstáculo e sim ele existir e os professores não perceberem que este obstáculo existe, por causa de o professor estar desengajado. Quando o professor encontra um obstáculo na sala de aula é por que ele está consciente, enxergando os obstáculos.
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Concordo, Janaina. Também pode haver situações em que o professor até tem consciência dos problemas, mas por estar desengajado ou por se encontrar solitário em sua prática, sem a participação e apoio de seus colegas de profissão, não consegue ver formas de superação para os problemas.
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Concordo plenamente que os obstáculos podem ser o início de uma melhoria na prática docente. No entanto, na quase totalidade das vezes, para resolver os problemas de sala de aula, o professor necessita “trocar figurinhas” com outras pessoas, sejam elas professores também, equipe pedagógica ou ainda a família. O que fazer quando esses outros participantes não querem diálogo com o professor?
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De fato, não é possível superar os obstáculos sem que se tenha consciência da existência deles. Problemas assim podem estar levando aos poucos o professor ao adoecimento, além de prejudicar o desenvolvimento dos alunos. É preciso que o professor se mantenha constantemente crítico e reflexivo de sua prática para que isso não aconteça. Também é preciso que o professor se sinta amparado pelo corpo docente e pedagógico para que possa encontrar meios de superar os obstáculo.
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Concordo, Mayara. O amparo daqueles ao redor do professor precisa estar sempre presente, para que mais e mais pessoas tomem ciência dos obstáculos que estão sendo identificados, a fim de resolvê-los.
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Em certas ocasiões, os obstáculos podem ser muito benéficos para os professores, ajudando-os a repensar em sua prática docente para que assim os danos sejam reduzidos ao mínimo. Contudo, o apoio da equipe pedagógica é crucial para o enfrentamento desses obstáculos, visto que o professor necessita de sua ajuda.
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Creio que evitar a apatia e o adoecimento geral do profissional docente na realização de seu trabalho é um fator crucial para que ele mantenha um olhar crítico das condições reais de seu ofício. Ou seja, quando o professor já está doente, todos os obstáculos são encarados como normalidade e inevitáveis, tornando o docente um indivíduo impotente de expor ou realizar mudanças em seu meio.
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