Autoconfrontação Simples com o professor “A”: análises e primeiras conclusões
por Anselmo Lima
Ao se observar em atividade de digitação, como foi possível observar no post anterior, ressaltando antes de tudo que essa é sua “opinião”, o professor indica que podemos “ver” que existe “um problema com [todos] os laboratórios de informática”, isto é, o fato de “a mesa onde fica o computador do professor” ser “baixa”. Com base nas palavras do professor e de nossa perspectiva analítica, esse problema pode ser compreendido da seguinte forma: existe a dificuldade de o professor conciliar duas atividades, as quais são conflituosas em função de a referida mesa do professor ser baixa: 1) a atividade de digitação; e 2) a atividade de dar aula, de fazer uma exposição. A primeira deve servir de meio ou instrumento principal de realização da segunda. Entretanto, de acordo com o professor, nas condições materiais do laboratório de informática em que trabalha, a atividade de digitação, especialmente quando se trata de “uma grande quantidade de código”, exige que ele esteja sentado: “eu tenho que sentar”; enquanto a atividade de dar aula exige que ele esteja em pé: “eu não consigo ver a turma” e “fico… na frente do computador”.
Diante do problema apontado, o docente propõe – rindo – que uma “solução seria comprar bancadas para o professor colocar o notebook… e ficar de pé… digitando”. De nosso ponto de vista, o riso do educador diz respeito a sua descrença em relação à possibilidade de haver investimentos na melhoria de suas condições imediatas de trabalho. Acreditamos que essa descrença – que se manifesta na forma desse riso – faça parte de uma descrença mais ampla na possibilidade de haver investimentos mais substanciais na educação em geral, seja em nível municipal, estadual ou nacional. O professor, aparentando – por meio de suas hesitações e dificuldade de expressão – estar tomando consciência do que acontece em sua prática pedagógica no exato momento em que se observa no vídeo, tenta explicar que, diante da ausência de bancadas, que podem ser aqui entendidas como mesas mais altas, a solução que ele encontra quando precisa digitar “pouco” é a de digitar inclinado: “eu tô digitando pouco então tô meio… não não tô sentado”.
Então há a tentativa de auxiliá-lo com a pergunta: “tá inclinado?”, a que ele responde afirmativamente: “[tô] inclinado”. Entretanto, faz a seguinte ressalva: “mas… quando se tem que digitar uma grande quantidade… não tem escapatória… você tem que sentar ali… e digitar”. Verifica-se que o professor – inclinando-se – compensa com seu próprio corpo a ausência de uma mesa mais alta, que lhe permitiria digitar em pé. Contudo, quando precisa digitar uma grande quantidade de código, sua única alternativa é se sentar, pois – do contrário – teria de permanecer inclinado por um longo período, o que – a curto prazo – lhe produziria desconforto e – a longo prazo – lhe causaria danos à coluna, prejudicando sua saúde física. O professor “A” parece, enfim, fazer todos os esforços possíveis para permanecer em pé e priorizar a garantia da qualidade do ensino-aprendizagem de seus alunos, mesmo que isso possa lhe prejudicar a saúde física. Desse modo, ainda que nesse contexto seja benéfico para o desenvolvimento discente, o gesto profissional de digitar inclinado parece insustentável para o docente.
Em meu próximo post apresentarei a sessão de Autoconfrontação Simples com o professor “B”, na qual será possível observar o modo singular como esse professor enfrenta essa “mesma” situação de trabalho.
Acho interessante pontuar que, quando o trabalho é bem realizado, professor, o próprio docente consegue enxergar os problemas que enfrenta. É claro que na maioria das vezes eles não são tão claros, mas, quando a autoconfrontação é levada a sério pelos interventores, os próprios professores conseguem ver onde estão os “reais” problemas.
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Duas coisas me chamaram a atenção nesse post, primeiro o fato da descrença do professor, o riso dele demonstrando demonstra que ele já sabe que esse problema será difícil de ser resolvido, no entanto, penso que o fato de ele já ter notado que existe um problema aí já um grande avanço.
Outro ponto importante é o risco da saúde física do professor, com o tempo ele pode sentir as consequências de ficar por muito tempo inclinado, e o que me deixa pensativa é que ninguém irá compensar o docente por ele ter se submetido a isso.
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Concordo, Camila, esse riso do professor foi crucial para refletirmos sobre toda essa estrutura que não pensa na acessibilidade para o professor.
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Neste breve relato é possível identificar primeiramente o quanto a estrutura não foi pensada para essa acessibilidade do professor e também o riso dele indica seu desanimo com tudo isso, por mais que o incomode e o atrapalhe, ele já está desmotivado quanto à melhoria desse acesso. Isso me relembra algumas discussões nos primeiros posts no qual abordávamos sobre o acomodamento muitas vezes do professor, por meio desse post fica muito claro que esse desanimo, desengajamento, nunca vem só por conta do professor, mas sim por toda essa estrutura e problemas em torno dessa, além de questões sociais e outros problemas que não cabe ao professor resolver e que aos poucos vão desmotivando-o o fazendo muitas vezes adoecer.
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Bem colocado, Barbara. Acredito que quando o problema depende de outras esferas para ser resolvido e não do professor, fica difícil de acreditarmos que a demanda do professor será um dia atendida conhecendo a realidade do ensino em nosso contexto.
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Concordo com vocês, sabemos a burocracia que as escolas possuem para trocar apenas uma lâmpada, imagina um problema maior então. Nesse sentido é complicado o professor ter motivações para dar aula, afinal a soma de todos os problemas leva a crer que realmente não haverá solução para as adversidades que surgem durante o caminho.
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Isso mesmo, Bárbara. É claro o sentimento de impotência do professor mediante as problemáticas identificadas que dependem de todo um sistema para serem solucionadas.
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Essa gravação me possibilitou uma reflexão a respeito de como cada área possui sua singularidade. Por mais que sejamos todos professores, cada prática e especial e possui suas peculiaridades.
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Essa gravação me possibilitou uma reflexão a respeito de como cada área possui sua singularidade. Por mais que sejamos todos professores, cada prática é especial e possui suas peculiaridades.
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